quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

As crenças e o grito do menino Bernardo Uglione Boldrini


AS CRENÇAS E O GRITO DO INOCENTE BERNARDO

Foto Reprodução: Pinterest / Bruna Braga

Texto do advogado Caleb Salomão Publicado no Jornal Diário de Cuiabá em 13/05/2014.
Caleb Salomão é advogado e professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito de Vitória (FDV). Publicou no Brasil, a obra “Artigos para Amar”. Escreveu também outros livros na área do Direito, como o recente “Constituição 1988 – 25 anos de valores e transições”. Endereço eletrônico: www.calebsalomão.com.br 


Bernardo Uglione Boldrini, como todo criança, alimentava fé incondicional naqueles que tinham por obrigação lhe dar abrigo e proteção, material e emocional, física e psicológica.

Tinha absoluta fé em sua mãe. Ligado espiritualmente àquela que lhe trouxe ao mundo, via em sua presença um porto seguro capaz de lhe oferecer segurança em qualquer circunstância. Este porto seguro sucumbiu diante da violência. Psicológica, se se confirmar a tese de suicídio dentro da clínica do marido e pai; física, se se confirmar suspeitas ressurgidas após o assassinato de Bernardo.

Roubada a sua fé na maternidade pela perda abrupta de sua mãe, sua primeira crença se dissipou. Mas a humanidade de Bernardo logo o encaminhou para uma nova fé. Nalgum momento, ele depositou suas crenças em seu pai e sua madrasta. O viúvo de sua mãe, cujo sangue ele representava, seria o seu porto seguro. E ainda teria o amparo da nova companheira de seu pai. Pode-se imaginar o conforto emocional de Bernardo quando viu sua vida sendo recomposta: ele seria, outra vez, parte de uma família.

Não demorou muito para esta fé se revelar vã. Desamparado afetivamente a partir do exercício displicente do dever da parentalidade (que obriga todos os responsáveis pela proteção e desenvolvimento dos inocentes e vulneráveis), Bernardo viu frustrada sua crença na afetividade de seu pai e de sua madrasta.

A rejeição que o vitimava dentro de usa própria casa transbordou para escola e vizinhança. O ambiente sagrado representado por sua casa não mais lhe oferecia aquele conforto tão desejado, o que deve ter lhe custado úmidas lembranças de sua mãe.

Mas Bernardo, confirmando a vocação humana, encontrou outra crença, uma nova fonte de esperança numa vida mais amorosa. Vulnerável e inocente, Bernardo fez chegar ao Estado – Ah, o Estado, essa entidade que nos protege! – as enormes ausências que afligiam sua pobre alma. Ausência de afeto, de cuidados emocionais, de atenção material e de segurança.

Os representantes do Estado, burocratas de um direito, cuja inoperância retrata a falência de uma nação, agiram segundo o protocolo, esta entidade míope que se presta a cultuar a ineficácia.

Assistentes sociais, promotores, magistrados – grandes representantes da burocracia que oprime pela ação ou pela omissão – apostaram na consciência do pai, acreditando, eles também, na possibilidade de uma reviravolta ética na vida do pai e da madrasta. Tolos! Deixaram de assistir Bernardo, em nome da crença estúpida na reconciliação familiar. Imaginaram saber e sentir mais que a vítima.

O resultado estava escrito nos antecedentes da humanidade e sua insanidade repetitiva, além do comportamento reiterado dos seus responsáveis: um casamento macabro entre interesses materiais e desprezo afetivo; Bernardo foi assassinado, sacrificado no altar da burocracia estatal por sacerdotes do mal que exerciam o papel de pai, de madrasta e de assistente social. Falsa assistente social! (Grifo nosso).

Mas, é reconfortante pensar, Bernardo não tinha crença apenas nos homens e suas limitações. Bernardo também alimentava a crença Naquele Ser que diz a tradição, olha por nós e oferece a proteção que este mundo por vezes nos nega.

Se todas as suas crenças foram vãs, Bernardo, que esta última não seja. E que tenha, finalmente, encontrado a proteção, que você tanto desejou e pelo qual procurou em pai, madrasta e Estado.

Com sua triste história Bernardo nos põe diante de uma constatação assombrosa: as instituições que nos sustentam estão gangrenadas. Todos falharam na proteção prometida ao inocente Bernardo desde sua concepção.

E, tristemente, nesta fábula, voltamos ao ponto de partida: a fé num Deus cuja face  desconhecemos, mas que nos dotou dos instrumentos necessários para a construção de um mundo bem diferente desta que aniquila inocentes como Bernardo.
Nossa incompetência, assim como nossos medos, leva-nos de volta a Deus.

Disponível em:

JÚRI POPULAR URGENTE PARA BERNARDO UGLIONE BOLDRINI E JUSTIÇA PARA ODILAINE UGLIONE!

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