NA INGLATERRA, APÓS REAVER GUARDA DA FILHA, PAI A MATOU COM GOLPES NA CABEÇA
Foto: Met Police
Transcrição: BBC Brasil
Um caso envolvendo o assassinato brutal
de uma menina de seis anos pelo próprio pai chegou ao fim nesta terça-feira (21/06/2016)
na Inglaterra, após um julgamento dramático.
Ellie foi morta dentro de casa, em outubro de 2013. Por
unanimidade, o júri considerou seus pais, Ben Butler e Jennie Gray, culpados.
Ele foi condenado a no mínimo 23 anos de prisão, e ela, considerada cúmplice, a
42 meses.
O crime consternou os britânicos pela violência: a
criança apresentava lesões no crânio e na coluna comparáveis às encontradas em
pessoas que sofrem acidentes de carro em alta velocidade e também pelo fato
de Butler já ter sido acusado de agredir a filha quando ela ainda era um bebê.
Ele havia conseguido reaver a guarda da menina apenas 11
meses antes de ela ser morta, o que levantou discussões sobre a atuação da
Justiça no episódio.
Pai perfeito
Em fevereiro de 2007, quando Ellie tinha
pouco mais de um mês de vida, exames constataram graves ferimentos em seu
corpo.
O pai foi considerado culpado pelas agressões e condenado
a 18 meses de prisão em 2009, mas três anos depois a Justiça britânica o
inocentou sob a conclusão foi de que os machucados na menina haviam sido
"acidentais".
Isso ocorreu após uma pesada campanha pela absolvição de
Butler, comandada pelo famoso agente publicitário britânico Max Clifford, que
mais tarde seria condenado por assédio sexual.
Pouco antes de conseguir a vitória, o casal participou de
programas de TV britânicos. Na ocasião, Gray dizia que o marido "estava
tentando ser o pai perfeito".
Ellie viveu com os avós enquanto esteve separada
do pai
A decisão de devolver a guarda, no fim de 2012, ocorreu mesmo
após assistentes sociais e os próprios avós de Ellie, com quem a menina estava
vivendo, tecerem críticas ao pai.
"Ela (a juíza) vai ter sangue em suas mãos se fizer
isso", havia dito Neal Gray, o avô materno. Segundo a imprensa britânica,
o casal gastou todas as suas economias, que totalizavam 70 mil libras (cerca de
R$ 350 mil), lutando contra o pai nos tribunais.
Ao absolver Butler, a juíza Mary Hogg escreveu: "É
uma alegria para mim ver o retorno de uma filha para os braços de seus pais.
Essa história não acaba hoje, ainda há trabalho a ser feito".
Com a decisão, o serviço de proteção dos assistentes
sociais à garota foi suspenso e substituído por uma agência independente,
responsável pelo acompanhamento do retorno da criança ao convívio dos pais.
Na imprensa, foram publicadas várias reportagens sobre a
"família injustiçada" e o primeiro Natal que eles passariam juntos, poucos meses depois, ela seria assassinada.
Foto: Met Police
Surto de raiva
A menina de seis anos foi encontrada
morta na casa da família em Sutton, a sudoeste de Londres, em 28 de outubro de
2013. Segundo a acusação, Butler teve um surto de raiva e aplicou golpes na
cabeça de Ellie até que ela morresse.
Jennie Gray, afirmou a Promotoria, foi chamada pelo
companheiro quando estava no trabalho. Ao chegar em casa, viu a filha morta,
mas não ligou imediatamente para o serviço de emergência. Ela acabou condenada
por crueldade infantil e por ter encoberto o homicídio.
Jennie Gray foi condenada por ajudar marido a
tentar encobertar o crime
O casal também inventou um plano para tentar destruir as
provas do crime e encenar uma queda acidental antes de chamar a ambulância, uma
farsa que envolvia o irmão mais novo de Ellie.
Eles mandaram a criança ir ao quarto da menina chamá-la
para comer bolo - quando chamaram a emergência, duas horas após a morte da
filha, era possível ouvir o menino dizer que "Ellie não estava
acordando".
O juiz do caso, Alan Wilkie, disse a Gray que ela havia
sido "excepcionalmente inocente e boba" para acreditar em Butler e
aceitar ser cúmplice dele na morte da filha.
Ele afirmou ainda que a mulher, que era verbal e
fisicamente abusada pelo marido, tinha uma dependência tão profunda dele que
estava disposta a fazer qualquer coisa pelo companheiro, inclusive participar
daquela "farsa grotesca".
Sobre Butler, Wilkie disse: "Você é um homem
egoísta, de temperamento difícil, violento e dominador, que considera seus
filhos e sua parceira como troféus, como se eles não tivessem qualquer função a
não ser satisfazer suas fantasias infantis e sentimentalizadas na vida familiar. Com você como patriarca a quem todos deveriam obedecer."
Revisão
A investigação sobre a morte de Ellie fez com que a
Justiça revisasse o caso que absolveu Ben Butler no passado. Com isso, novas
informações vieram à tona.
Ao considerar que o pai da menina não havia sido
responsável pelos ferimentos em Ellie quando bebê, a juíza Mary Hogg afirmou
que havia ocorrido um "erro judicial".
O efeito disso foi a revogação de qualquer forma de
proteção à menina, que retornou à casa dos pais sem qualquer acompanhamento
para saber se ela estava sendo bem cuidada.
"A ordem da juíza deu permissão a Butler para
apresentar o documento emitido por ela a qualquer escola, médico, assistente
social, enfermeiro ou policial que viesse a entrar em contato com a
família", explicou o repórter da BBC que cobriu o caso, Gaetan Portal.
"Butler teve, como efeito disso, a garantia de uma
poderosa arma legal contra qualquer um que levantasse questionamentos ou
preocupações sobre o bem-estar de Ellie no futuro. A juíza também determinou
que os assistentes sociais locais não poderiam mais supervisionar a
menina."
Profissionais independentes ficaram com a missão de
acompanhar o caso, mas nunca receberam informações sobre o histórico da família
ou sobre as questões que pairavam sobre Butler, que tinha outros históricos de
violência.
Eles foram orientados apenas pela decisão de Hogg, que
classificava todas as acusações contra o pai como "um erro".
A equipe de assistentes sociais independentes acompanhou
o retorno de Ellie para casa por três meses e não reportou nenhum problema
familiar. Eles entregaram o relatório final à Justiça em abril de 2013, seis
meses antes do crime.
Segundo funcionários da escola da menina, ela faltou
bastante à escola nos meses anteriores a seu assassinato. Ao ser cobrada pelo
envio de atestados médicos que comprovassem os motivos das ausências, Grey
ficou "brava e agressiva", disse ao júri a assistente administrativa
Kelly Vennard.
O avô materno de Ellie critica o sistema que permitiu a
devolução da guarda da neta a seu assassino.
"O sistema falhou com
ela, e conosco também. É tarde demais para Ellie, mas não para salvar outras
crianças", afirmou ao jornal The Guardian.
"Quero garantir que isso jamais ocorra com outra
criança."
OBSERVAÇÃO: No Brasil, após a Justiça confirmar que o filho continuaria sob a guarda do pai, este com a cumplicidade da madrasta do menino, o matou com dose de injeção letal. Até quando, essas histórias irão se repetir? É o que nos perguntamos ao tomar conhecimento de fatos tenebrosos como esses que aconteceram com Bernardo, com Isabela, com Alex, com Joana e com Ellie e que continuam a acontecer diariamente com milhares de crianças pelo mundo afora. Quando a violência aflora num lugar que deveria ser classificado como o mais inimaginável: o lar.
As pessoas humanas são passíveis de erro e os criminosos estão mais do que dispostos a contribuir com essa ideia. Qual a solução afinal? Ouvirem mais as crianças, ficando sensíveis às suas necessidades? Os exemplos está aí: então, onde afinal, reside o engano? Na pessoa humana que acredita no seu semelhante ou que está mais preocupada em manter suas relações, ainda que tóxicas? Na autoridade competente que está mais preocupada em resolver a situação ou em praticar a Justiça?
Jussara Uglione tentou reiteradamente obter a tutela do neto mas sem sucesso, constatando aí, uma desoladora semelhança com o caso de Ellie. O mais fraco, literalmente, não vence o mais forte nunca. Somente numa causa realmente justa é que o fraco vence o forte (Sófocles).
Essa é a questão fundamental: a causa justa, de fato, em prol de qualquer criança, indiscriminadamente. Parafraseando o avô materno de Ellie:
É tarde demais para Bernardo Uglione Boldrini, mas não para outras crianças.
É tarde demais para Bernardo Uglione Boldrini, mas não para outras crianças.
Precisamos garantir que isso nunca mais se repita com nenhuma criança!
JUSTIÇA PARA ODILAINE E BERNARDO UGLIONE BOLDRINI!